quinta-feira, 7 de outubro de 2021

Sobre a Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital - uma breve introdução

Uma breve introdução


O ciberespaço é uma realidade da sociedade contemporânea moderna.

O ser humano divide-se entre a sua identidade na sociedade física, e na sociedade digital, trazendo assim novas situações que requerem enquadramento legal.

Atualmente, o indivíduo trabalha, estuda, tem vida social, exerce a sua cidadania, disfruta de lazer, em ambas as realidades (física e digital) e é tempo de estabelecer as normas de conduta, os limites permitidos, os comportamentos permitidos e os proibidos dos cidadãos, das organizações, das empresas, do próprio estado.

Deste modo pretende-se evitar que situações de conflito fiquem na zona do limbo jurídico – sem solução, sem atribuição de responsabilidades, sem ressarcimento das vítimas.

Uma sociedade evoluída analisa os temas atuais e estabelece linhas de rumo de modo a que a harmonia permita uma vida estável e em segurança para todos os cidadãos.

É certo que muito ainda falta fazer, no entanto, esta carta de direitos da era digital, é um início de algo que se pretende mais aprofundado pois a revolução digital atual que atravessamos é de um dinamismo alucinante e que não se compadece com lentidão de análise e decisões. temos de saber acompanhar os tempos atuais para nos prepararmos para os que estão a chegar.

(...)

Paula Franco





segunda-feira, 3 de maio de 2021

Uma sociedade juridicamente evoluída

A segurança jurídica é uma das finalidades do Direito e um dos pilares fundamentais para que uma sociedade viva em harmonia e paz, produzindo assim uma estabilidade que irá permitir o seu desenvolvimento e evolução.

Os cidadãos, as pessoas coletivas, necessitam de sentir que existem normas aplicadas a todos e que quem não as cumprir, sofrerá sanções. Precisam de saber que todos por igual têm direitos e obrigações e se algum direito não for respeitado podem aceder a um sistema jurídico que resolverá o litígio, ouvindo ambas as partes e decidindo com imparcialidade.

Esta ideia de ordem e paz pretende contrariar a lei natural do mais forte, dominante num tempo muito longínquo em que o ser humano não centrava na lei escrita pelos Homens o modo de reger as suas vidas.

Desde então temos evoluído neste sentido civilizacional e, apesar de ainda termos um longo caminho a percorrer, este modo de vida em sociedade tem permitido a Humanidade criar laços de cooperação, de entreajuda, de respeito fundamental dos direitos humanos, de impor o respeito de igual modo sobre todos os cidadãos e perante todos também.

No entanto, mesmo perante esta conceção do Direito como orientador de uma vida em harmonia entre pessoas e até países diferentes, encontramos comportamentos desviantes, alguns completamente opostos ao estabelecido na nossa Constituição, o “respeito pelos direitos e interesses dos cidadãos”.

Assistimos a abusos e violações de direitos humanos dos cidadãos, alguns deles inadmissíveis à luz do Século XXI, trazem um aumento não apenas dos crimes praticados mas também do seu nível de violência.

Assim como desvios ao cumprimento de obrigações impostas a todos e cuja impunidade é cada vez mais notória e chocante para os cidadãos, criando ideias de injustiça e corrupção no modo como as pessoas percecionam o sistema de justiça.

Tudo isto parece, por vezes, surgir uma visão paradoxal entre o avanço civilizacional e o comportamento desviante dos cidadãos – ou seja, a ideia de que quanto mais evoluídos estamos, pelo menos tecnologicamente, mais violentos e não cumpridores nos tornamos.

É como se a mente humana existisse em polos completamente opostos, afastando-se em vez de se aproximar, como deveria estar a acontecer.

Muito provavelmente temos de repensar as estratégias que temos usado para passar a ideia de respeito pelos direitos de todos e a de responsabilidade em cumprir as obrigações que o Direito nos impõe. Ao fim de contas, o bom cumprimento do Direito e por conseguinte o alcançar os seus objetivos, começa na educação da sociedade e na preparação de cada cidadão para a vida em sociedade.

Continuar a descurar a educação jurídica irá trazer graves problemas e desequilíbrios, e uma sociedade, seja nacional, seja global, instável, não trás vantagens nem a governos nem a cidadãos, sejam particulares sejam coletivos.

O tempo escasseia no que toca a construir um amanhã humanamente mais avançado. Urge apostar em ter o estudo do Direito desde cedo nas escolas, mantê-lo nas várias áreas de ensino e alargá-lo a todas as idades e públicos.

O século XXI deve ser um século de uma sociedade juridicamente fundamentada e evoluída, na ação e no pensamento.


Paula Franco

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segunda-feira, 5 de abril de 2021

Os (novos) sujeitos laborais à distância

O contexto atual é responsável por várias mudanças que estão a acontecer um pouco por todas as áreas da sociedade.

O direito do trabalho não é exceção e tem sido um dos mais visados pelos eventos atuais. Num curto espaço de tempo mudou-se o paradigma do conceito de relação laboral que até agora tem sido maioritariamente entendido: uma relação assente na presença física entre os sujeitos intervenientes, i. é, entre empregador e trabalhador. Os contratos de trabalho são redigidos e projetados, na sua grande maioria, a pensar num local de trabalho físico, com um horário de trabalho de entrada e saída desse local, funções a exercer nesse mesmo local que está organizado de modo que possa ser controlado pela entidade patronal. O poder de direção do empregador, determinado pelo Código do Trabalho, é exercido em pleno pois ambas as partes lidam uma com a outra, presencialmente, num espaço pertencente ao empregador. Não nos podemos esquecer que o contrato de trabalho tem como elemento fundamental o intuito personae.

Ora, com esta repentina mudança de paradigma de (inclusive) obrigatoriedade da relação laboral ser à distância, entrou-se em terreno ainda muito desconhecido. Uma relação laboral presencial tem certas caraterísticas e consequências; uma relação laboral digital, à distância, acarreta aspetos e tem impacto diferente, quer na vida da entidade patronal, quer na do trabalhador.

Esta passagem repentina e com o peso da obrigatoriedade não é fácil porque a maior parte dos sujeitos laborais tem comportamentos e mentalidade baseada numa relação laboral presencial.

Desde logo, do lado do trabalhador, passa a ter uma fenomenal importância para a sua produtividade, a sua capacidade de autonomia, de gestão de tempo, de organização pessoal – este está agora no seu espaço pessoal, portanto sob a influência de variados estímulos associados ao lazer, à diversão, ao descanso. Saber compartimentar os seus lados da vida, o pessoal do profissional, saber fazer um perfeito work by blend, requer mudança de mentalidade, requer desconstruir hábitos enraizados e criar novos. E esta mudança cultural não pode ser só com o trabalhador, toda a sua família tem também de acompanhar e por isso mudar como entende o trabalho – aquela pessoa já não vai sair de casa para o local de trabalho e vai estar sempre em casa, ali à mão de uma conversa, de uma solicitação. Tudo isto é tentador para os familiares do trabalhador que passa a precisar de um espaço só para si e de, na sua casa, no seu espaço pessoal, ter um ambiente de trabalho – sem ruídos, sem distrações.

Outro problema que surge vem depois, passado algum tempo, com a nova rotina imposta. Sempre no mesmo espaço, retira ao trabalhador a possibilidade de contacto quer com colegas quer com outras pessoas que habitualmente contactava no percurso para o local de trabalho. Digitalmente não há a tentação de parar para uma conversa com os colegas nem sequer existe o convívio na pausa para o almoço. E isto começa a desmotivar o trabalhador. Desmotivação provoca falta de produtividade.

Urge, por isso, refletir que não se pode ver o trabalhador à distância do mesmo modo que se vê e se lida com um trabalhador presencial. Muito menos se podem fazer contratos de trabalho iguais, existem especificidades de cada um e não se pode apenas mudar a cláusula do local de trabalho dizendo que é “em casa”, “é em teletrabalho”, por exemplo. Temos de considerar o horário de trabalho, as pausas e intervalos para descanso, o poder de direção, novos direitos e novos deveres inerentes à realidade “à distância”, entre tantos outros aspetos a considerar ao redigir um contrato de trabalho.

De modo a elaborar contratos de trabalho que efetivamente se apliquem à relação laboral à distância, exige também que a entidade patronal à distância não se pode comportar como se fosse uma entidade patronal presencial. Se não mudar o seu entendimento, se não tiver esta visão estratégica, corre o sério risco do insucesso.

Ao Direito do Trabalho cabe a tarefa de orientar e guiar de modo sábio, ponderado, mas visionário estas novas relações laborais e não seguir conceções desadequadas ao contexto em causa e muito menos ceder a tentações populistas de soluções que depois na prática não irão beneficiar nem o trabalhador nem o empregador.

Estamos num momento importante de finalmente evoluirmos no entendimento do trabalho e dos seus sujeitos, de ver o trabalho e o lazer como dois lados que se complementam em vez de os ver como opostos.

O work by blend exige mudança de mentalidade, de ambas as partes. Saibamos aproveitar.

 

Paula Franco

reservados os direitos de autor 


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sábado, 27 de março de 2021

Direito de Autor no Século XXI

O Direito de Autor tem por base o intelecto humano que, através da criatividade, consegue exteriorizar uma ideia do seu criador.

A essa ideia exteriorizada, a lei denomina de obra.

A mesma lei considera, por tal, que o intelecto humano pode ter ideias e exteriorizá-las (ou seja, convertê-las em obras) em três domínios clássicos: literário, artístico e científico. E assim tem sido o entendimento não só da lei mas também da jurisprudência, da doutrina bem como tem sido assim que tem é transmitido a qualquer aluno de Direitos de Autor.

Na verdade, para todos nós, ainda está bem presente o conceito, a visão de que a Arte, a criação do intelecto humano, situa-se em autores como Vincent Van Gogh, Miguel Ângelo, Leonardo da Vinci, Míron, Pablo Picasso, Wolfang Amadeus Mozart, Almada Negreiros, entre tantos outros. Consideramos que através da Arte, a pessoa imortaliza-se.

Na sequência deste entendimento, a lei estabelece o regime jurídico aplicável aos direitos de autor, com base na visão de que aquilo que é criado pelo intelecto humano, nestes três domínios clássicos, merece proteção legal.

Todavia, tal como disse Bob Dylan, os tempos estão a mudar. Tempos esses que se iniciaram com a introdução das nossas vidas de fenómenos como a rádio, a televisão, o cinema. Mudanças que se interligam com avanços tecnológicos, com novas descobertas, com a inovação.

Avançando até aos tempos modernos do século XXI, conseguimos detetar, mais uma vez, formas novas associadas à criação produzida pelo intelecto humano: o avanço da Quarta Revolução Industrial que trouxe programas informáticos que nos dão uma outra forma de Arte - a arte digital. Tal como já acontecera com a música, com o surgimento da música eletrónica, a arte digital veio para ficar e já está a conquistar o público e galerias. 

Qual a ideia a reter? É que o Direito de Autor é um ramo das ciências jurídicas que, por força da sua génese, é influenciado pelos avanços tecnológicos que o ser humano cria e desenvolve.

Desta forma, para além de ser influenciado pela evolução tecnológica, tem de acompanhar a mesma em termos jurídicos. 

E é neste ponto que é fulcral o debate sob o qual nos debruçamos:

Qual o posicionamento jurídico do Direito de Autor perante as criações artísticas com origem na arte digital.

Diversas situações já têm ocorrido que levantam o véu sobre esta temática.

Recentemente a obra digital do autor Beeple (nome artístico de Mike Winkelman), foi vendida em leilão através da internet por 69,4 milhões de dólares.

A obra denominada "Todos os dias: os primeiros 5000 dias" consiste uma colagem das fotografias tiradas por Beeple desde maio de 2007. A juntar a isto o preço pelo qual foi vendida, e a forma - leilão via internet -, e temos um bom e consistente exemplo de que esta revolução no mundo dos direitos de autor está em marcha e se o Direito, para ser eficaz e eficiente, tem de acompanhar a evolução da mentalidade e dos comportamentos da sociedade global. 

Tempos interessantes estão no limiar da sociedade atual. No entanto, isto implica a necessidade de um pensamento juridicamente visionário.

Só assim o Direito cumpre a sua função de garante de uma vida em sociedade com base na harmonia e segurança jurídica.

Não basta, de modo algum, que o Direito apenas acompanhe a evolução da mente Humana, ele próprio tem de evoluir. A dialética Direito e Ser Humano tem de ser uma sinfonia perfeita de modo a por em prática os ideais proclamados por todas as Nações e indivíduos. 


Paula Franco

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quarta-feira, 3 de março de 2021

é tempo de pensar no amanhã

Sem cooperação, os seres humanos e por conseguinte os países, não sobrevivem à mais pequena dificuldade. 

Tem sido assim desde os tempos primitivos - a necessidade de entreajuda entre os membros da mesma tribo, da mesma cidade, do mesmo reino, para enfrentar as ameaças quer internas quer externas.

Esta capacidade de solicitar ajuda e de também ajudar, de parceria, é uma caraterística que se entreliga com o nível de evolução do ser humano e da Humanidade - quanto melhor a compreende e sem receios de nacionalismos e percas de soberania ou autonomia, um povo, uma pessoa, recorre à mesma, mais evoluído é. 

Ficar fechado em si, procurar solucionar situações sozinho, primeiro demora mais tempo a ultrapassar o desafio, segundo nunca chega à melhor solução. É da troca de ideias, de experiências, que se encontram as melhores soluções aos problemas e se ultrapassam os mesmos.

Isso implica saber ouvir, mesmo aqueles com os quais temos menos afinidade - se queremos melhorar e evoluir. 

Este é o tempo em que temos de tomar consciência que, se lidarmos sozinhos com as situações, estaremos a perder tempo e a desperdiçar oportunidades. Se estivermos em sintonia, soubermos aceitar ajuda e também a dar, nunca estaremos sós. 

O amanhã depois deste ano de tormenta que atravessamos, só pode ser o da Humanidade unida na sua diversidade. 

Paula Franco 




sábado, 16 de janeiro de 2021

O Mundo Que Encontrámos

O mundo que encontrámos depois da meia-noite não é um mundo diferente do que vivemos o ano passado, apenas lhe acrescentámos uma boa dose de esperança e mais uns sonhos para conquistar. 

De resto, somos os mesmos, os lugares são os mesmos, as circunstâncias as mesmas. 

É verdade que se muda do dia para a noite, de um minuto para o outro, sim, isso acontece ao longo da nossa vida. Mas essas mudanças são espontâneas, nunca são as programadas. As mudanças que começam na nossa consciência com "amanhã vou mudar" ou "agora vou mudar", nunca ocorrem verdadeiramente. No entanto, aquelas que nem nos apercebemos, ficam e conduzem-nos a novos comportamentos e pensamentos, quase que inconscientemente.

Assim, vamos lidando com o novo ano com espetativa de ver o que vai acontecer, como vai acontecer, como vamos ser e atuar; em vez de traçar um plano de "agora é que vai ser".
Se algo o ano passado nos ensinou, é que os gigantes também tombam, é que o destino não é assim tão controlável nem por escrever. Um pequeno abalo e tudo o que damos por certo, por rotina, por "vai ser assim", desvanece e perturba-nos. 

Muito provavelmente o Homem primitivo lidava melhor com as crises inesperadas do que o sábio Homem moderno, pois sabia que a qualquer momento o seu estilo de vida mudava radicalmente e estaria na luta pela sobrevivência.

Muito provavelmente, deveríamos procurar dentro de nós esse instinto primitivo de sobrevivência e adaptarmo-nos para sobreviver e continuar a desbravar caminhos por percorrer.

Há milhares de anos, o Homem não tinha tempo para dramatismos. Tinha de aceitar os factos e procurar ultrapassar os obstáculos. Hoje em dia, andamos a perder demasiado tempo precioso com factos consumados em vez de procurar na adaptabilidade e criatividade as nossas mais valias para sobreviver e reconquistar o destino que queremos.

Paula Franco
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segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Nos confins mais remotos e perdidos da História da Humanidade

O passado não é algo dado e fechado, está continuamente em mudança pois tudo depende de como o lembramos, ou seja, a nossa perceção de como ver, analisar e entender factos passados, vai mudando com o evoluir da nossa mentalidade e isso altera inevitavelmente como voltamos a percecionar factos já ocorridos.


Tal como a vida, o passado é também dinâmico, evolutivo.

Isto conduz-nos a uma conclusão: o passado pode e tem diversos pontos de vista que variam consoante a nossa mentalidade no momento.

E seguir o caminho dos antigos a que o passado nos conduz, exige vontade em embrenhar-se nos confins mais remotos e perdidos da História da Humanidade.

Podemos nunca mais de lá voltar.

É uma viagem pessoal e coletiva aos confins perdidos e sombrios da mente de nós próprios enquanto Humanidade, noutro tempo, noutra era.

Exige de nós uma grande abertura de pensamento e de entendimento. O não julgar os Homens e as Mulheres do passado é uma tarefa difícil porque o ser humano é um ser emotivo por natureza.

Os exercícios racionais a que nos sujeitamos e nos massacramos, na crença de que evolução é racionalidade, são logo afastados em situações em que experimentamos eventos que abalam as nossas convicções.

Há e sempre haverá um punhado dos que são racionais, fugindo a esta caraterística humana intrínseca em cada um de nós: reação emotiva a fortes eventos.

Todavia, o mundo, no geral, avalia e reavalia o passado de modo emotivo, condenando ou absolvendo eventos emocionalmente. 
Esta viagem profunda por caminhos e ruelas do passado não nos deve fazer perder o presente ou sequer esquecer o futuro.

Um dia o presente e o futuro serão passados a serem analisados e avaliados por outros que virão depois de nós e que o irão fazer também emocionalmente. E podem não concordar com as nossas escolhas. E seremos julgados por isso.

Não há nada de mal em usar parte do nosso tempo a re-analisar o passado. Não é tempo desperdiçado, é sim tempo recuperado que irá ser projetado no futuro.

Não podemos avançar sem termos compreendido o que ficou para trás.

Cada vez mais a Humanidade, em prol de preparar um futuro conscientemente melhor para o Planeta, deve voltar a debruçar-se sobre acontecimentos da História pois se atualmente continuamos a cometer erros anteriormente cometidos, é porque não fizemos uma boa análise e interpretação e consequentemente, com ele (passado) nada aprendemos o que significa dizer, que não evoluímos.

E sem evolução, o futuro não acontece.

P.C. Franco



sábado, 31 de outubro de 2020

Sobre ética, limitação orgânica, evolução e construção de legados

É preciso perceber que o ser humano vive em roda destes aspetos: a ética das coisas e dos comportamentos, o facto de sermos organicamente limitados no tempo, a necessidade intrínseca de evoluir e a mentalidade de cada pessoa querer deixar um legado para a família e para o próprio mundo.

Estes são os ingredientes introdutórios a um tema que irá nos próximos anos fazer parte dos nossos debates e conversas, enquanto seres individuais e enquanto sociedade. 

Transumanismo – um futuro inevitável.

Nascemos limitados pelo facto de sermos orgânicos e por isso perecíveis, finitos.

É certo que até certa altura da vida vamos evoluindo e dando o próximo passo no melhoramento do nosso organismo, todavia a partir de determinado ponto de viragem, é precisamente o inverso que acontece. Decaímos.

Alguns mais depressa do que outros, devido a diversas variantes e condicionantes: umas da nossa responsabilidade, outras nem por isso. Culpa da genética, do meio ambiente, da área geográfica, de comportamentos dos adultos enquanto eramos crianças, uma panóplia de influências que vão determinar se o nosso envelhecimento é mais rápido ou mais acentuado do que de outros seres biológicos que nasceram e cresceram tal como nós, humanos.

A finitude está presente em quase tudo na nossa vida, até o próprio planeta é finito. Um dia, daqui a muitos milhares de anos, coisa que não nos afeta tão cedo mas que há de afetar alguém.

O dia tem um fim, as férias, as aulas, o dia de trabalho, o contrato de trabalho, o contrato de arrendamento, o filme, o livro, a viagem, tudo gira à volta de um início, um meio e um fim.

E esse fim atormenta-nos sobretudo em relação ao nosso organismo e às coisas que podemos fazer enquanto respiramos por nós próprios, pensamos por nós próprios. Ou seja, o saber que um dia isso deixará de ser possível do mesmo modo que o fazíamos quando ainda estávamos a evoluir, dá que pensar.

Tanta coisa ainda por fazer, por viver, e tão curto espaço de tempo.

Parece que não faz sentido. Dão-nos vida e depois pouco tempo para a aproveitar. É como partir em desvantagem numa corrida, o tempo já vai à frente e nós ainda nem arrancámos.

Lidar com isso não é fácil, aceitar muito menos, viver isso é perturbador. Por muito que algumas pessoas digam que gostam de chegar a uma idade avançada e até estão a gostar da mesma, não deve haver um dia que não pensem que gostavam de ainda ter as mesmas capacidades de quando eram jovens, capacidades físicas e intelectuais que lhes permitam acompanhar a vida não só deles próprios mas também daqueles que os rodeiam, de uma forma mais próxima e energética. Nem que fosse somente acompanharem os que os rodeiam evoluírem. Algo que sabem bem que não o vão poder fazer até quando gostariam.

É um paradoxo.

Ou então é um desafio de gestão de tempo. Talvez o nosso objetivo primordial de vida é saber gerir o pouco tempo biológico que nos é concedido. Nem é ser feliz ou alcançar muito sucesso, é simplesmente saber gerir o tempo.


Paula Franco

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quinta-feira, 22 de outubro de 2020

As gerações que carregamos em nós, as gerações que virão

Somos e existimos para além do tempo e do espaço que vemos com os nossos olhos.

Descendentes de antepassados, temos tendência para esquecer ou arquivar num dos cantos da nossa memória as nossas raízes e heranças de outros e, queremos com toda a força, construir um novo eu, como se viéssemos do zero.

É uma bela tentativa de nos afirmarmos na sociedade complexa que habitamos, conquistar um espaço só nosso, que nada tenha a haver com os antepassados que vieram antes de nós.

A nossa ignorância leva-nos a atuar assim.

Na verdade, devíamos saber bem que não seriamos o que somos hoje sem essa evolução de geração em geração; somos o resultado da evolução através dos tempos de uma família que se foi construindo através do tempo e do espaço.

Para o bem e para o mal, carregamos no ADN a história, a memória, a vivência, os traços físicos, a saúde, a doença, os sonhos, os medos, os demónios de todos os que nos antecederam.

Todos esses sonhos e monstros culminaram naquilo que somos hoje.

E devemos ser orgulhosos disso. E não tentar apagar e construir um novo eu, à nossa maneira, como se fossemos uma novidade.

Não somos. Não somos novidade no turbilhão do universo. Somos uma evolução de outras evoluções antes de nós. E daremos lugar a próximas evoluções que se querem melhor que nós.

E ainda bem que carregamos os sonhos e monstros dos nossos antepassados nos genes e os iremos passar a outros. Eles fizeram de nós aquilo que somos hoje.

A única variante que o cosmos nos permite é aquela que Elvis Presley e Frank Sinatra cantavam e imortalizaram, vivermos à nossa maneira.

E a maior parte das pessoas vive de acordo com a sociedade e não à sua maneira, desperdiçando assim a única coisa que podemos efetivamente controlar neste infindável ciclo de vidas que nascem e morrem, que dão origem a outras que darão origem a outras.

Paula Franco

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sexta-feira, 17 de julho de 2020

O Tempo dos Novos Tempos

O vento levou as palavras
do homem sábio
para longe desta terra
esquecida pelo tempo.

Os que o seguiram
nunca conheceram dias
sem dor, lágrimas e
esperança sem limites.

E, um dia, o vento deixou
de soprar e as palavras
deixaram de percorrer
os árduos caminhos da terra.

Uma nova era erguera-se
no horizonte, para além do que
se podia ver ou imaginar.
Seria o Tempo dos Novos Tempos.


P.C. Franco

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segunda-feira, 23 de março de 2020

os dias e as noites em que éramos outras gentes

a estrada sem fim perdia-se no horizonte
deixando para trás uma cidade perdida
e abandonada
por todos e pelo tempo.

histórias de outrora não mais foram
contadas, repetidas ou ouvidas.
os novos cresceram sem o passado
que os fez homens e mulheres
de esperança e vontade.

se um dia voltarmos ao que fomos,
ao que acreditámos, 
será para lamentarmos os
abraços, as lágrimas, os sorrisos,
que se perderam
em dias e noites em que éramos
outras gentes.

P.C. Franco

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os sonhos que se perdem

Naquele dia o mar levou-nos
para longe da terra
que viu os nossos sonhos
erguerem-se do nada.
Outrora sonhadores,
outrora conquistadores...
Tivemos de dizer adeus,
tivemos de nos afastar.
E, do nada, o tempo fechou-nos
na eternidade dos que
jamais regressaram.

P.C. Franco

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sábado, 7 de março de 2020

o trovão gigante

os trovões gigantes acordaram a cidade e todas as pessoas fugiram
tornaram-se vultos sem nome nem casa nem história
porque fugiram sem levarem as memórias
abandonaram sentimentos e ideias outrora construídos
e ergueram novas paredes e muros à volta do desconhecido

não te esqueças do que já fostes,
não construas de novo sem saberes quem és,
descobre-te nas raízes que carregas no teu íntimo 

não te percas.

P.C. Franco


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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

O Joker de Joaquin Phoenix

Numa noite em que se celebram momentos de glória, imortalizam-se pessoas e filmes.
As horas tinham passado e o fim da cerimónia aproximava-se do momento que eu mais aguardava, saber se a Academia de Artes de Hollywood reconhecia Joaquin Phoenix como o Melhor Ator Principal de 2019.
Em causa estava a sua brilhante e perturbadora interpretação de Arthur Fleck, ou podemos dizer, Joker, numa distante e problemática Gotham City que ainda não tinha visto nascer Batman.
Na verdade, o brilhantismo do filme de Todd Phillips, é que nos dá o nascimento de duas personagens do mundo da DC Comics que, apesar de tão diferentes, se complementam: Joker e Batman.
Do caos de repente criado na sua vida ao perder os seus pais, vimos em Bruce Wayne nascer a essência que irá torná-lo no Cavaleiro das Trevas.
Do enigma e desequilíbrio permanente, assistimos a Arthur Fleck caminhar inevitavelmente para um destino de revolta e ódio que envolverá a sua vida como Joker.
A viagem que Arthur faz é acompanhada por todos os espetadores, tendo Joaquin Phoenix conseguido criar no público aquilo que a personagem ia sentindo e no que se tornou. 
Por isso o público, de todos os quadrantes que uma sociedade possa ter, aplaudiu esta performance.
Sentimos os passos dados e a evolução ao longo do filme.
Um mestre a interpretar, um ator nascido de um percurso rico em experiências e com um ponto de vista diferente da sociedade, foram ingredientes que fizeram Phoenix imortalizar-se na noite de ontem.
Só uma pessoa diferente poderia ser um ator que provocaria o desespero, a tristeza, a simpatia, a repulsa, simultaneamente nos espetadores. 
Finalmente, o reconhecimento de alguém que nasceu para dar vida a outras personagens e torná-las memoráveis.
O Joker de Joaquin Phoenix está inscrito nas estrelas da História da Humanidade.

P.C. Franco 




sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

os dias de elaphobolia

I

a estrada que encontrei levou-me ao vale dos dias sem fim
& das noites eternas de sonhos outrora sonhados por outros
& outras de lugares e com rostos que nunca vi

II
foi naquele momento suspenso no tempo que vi para lá
do horizonte que eu ambicionava, e, digo-te,
não gostei das terras desconhecidas que se ergueram

III
abracei o oceano e naveguei por tempestades sem sentido,
procurei a margem de um paraíso que nunca existiu,
pretendi um reino que não se vê daqui da minha torre.

IV
um dia, numa manhã como as outras, o vento parou por instantes
e, longe de mim, senti o destino, inalcançável, ali perto, ali distante,
a sorrir-me por entre o véu da minha mente crente na vontade de mover
os mundos de todos os mundos.
a vontade permaneceu apesar das trevas, o horizonte desvaneceu-se,
mas os oceanos continuam, com navios que não se afundam,
à espera de exploradores sem medos das marés & dos Deuses acima de nós.

P.C. Franco

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‘Vendedora de alcatraces’, de Alfredo Ramos Martínez, 1929. Foto: The Alfredo Ramos Martínez Research Project /Museo Whitney